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domingo, 13 de abril de 2025
O eco inflexível de Manoel Leal de Oliveira
Na cidade de Itajuípe, Bahia, em 29 de maio de 1930, nascia Manoel Leal de Oliveira, um homem cuja vida seria marcada por um compromisso incansável com a verdade. Filho de uma terra onde o cacau moldava sonhos e conflitos, Manoel começou a trabalhar aos 12 anos em uma fábrica de sorvetes em Itabuna, carregando desde cedo a determinação que definiria seu destino. Com estudos até o segundo grau, ele encontrou no jornalismo sua vocação, uma chama que o levou a trabalhar em publicações como Última Hora e Jornal do Commercio no Rio de Janeiro, onde já demonstrava sua coragem ao defender um colega, sendo acusado de comunista e deixando o emprego por princípios.
De volta à Bahia, Manoel fundou, em 1952, o jornal A Terra em Itabuna, um veículo combativo que desafiava os poderosos e dava voz aos marginalizados. Sua escrita polêmica, afiada como uma lâmina, incomodava elites e autoridades, mas conquistava leitores pela honestidade. Em 1960, criou a Tribuna Regional e, em 1987, ao lado do escritor Hélio Pólvora, lançou o Cacau Letras, um jornal literário, e o A Região, que se tornaria seu principal legado. Esses projetos refletiam sua visão de jornalismo como ferramenta de transformação, um espelho da realidade que não se curvava a pressões. Por sinal, a coluna mais lida do A Região era a "Malha Fina", escrita pelo próprio Manoel, onde era realizada a grande maioria das denúncias bombásticas, em tópicos curtos e impactantes.
Além do jornalismo, Manoel era um homem de múltiplas facetas. Plantador de cacau desde os anos 1950, atuou como consultor do Conselho Nacional dos Produtores de Cacau e dirigiu a Companhia Viação Sulbaiana a partir de 1978. Proprietário da gráfica Colorpress, ele dominava o ciclo da palavra impressa, da criação à distribuição. Sua vida profissional, contudo, não o afastava da simplicidade: aos domingos, frequentava a casa de praia do amigo Agostinho “Guga” Nunes, onde se entregava a momentos de lazer, ou passeava com seu cão fox, Átila, por quem nutria um carinho especial. Como passatempo, encantava com truques de magia, revelando um lado lúdico que contrastava com sua firmeza jornalística.
Casado com Wanda Vicentini de Oliveira, Manoel era pai de Marcel Leal, 37 anos, Valéria Leal, 34, e Adriana Leal, 33, na época de sua morte. Sua família era o alicerce de uma existência dedicada ao trabalho e à justiça. Reconhecido por sua atuação em prol dos necessitados, ele recebeu o Prêmio CDL de Imprensa como Melhor Jornal e homenagens por sua solidariedade. Sua vida, porém, era marcada por tensões: o jornalismo investigativo que praticava o colocava na mira de adversários, e ele sabia que a verdade tinha um preço alto.
Em 14 de janeiro de 1998, por volta das 20 horas, Manoel Leal de Oliveira foi assassinado com seis tiros ao chegar em sua casa no bairro Jardim Primavera, em Itabuna. Naquele dia, sinais de ameaça já pairavam: às 16 horas, ele recebeu um telefonema alertando que talvez não estivesse vivo no dia seguinte; às 18 horas, um funcionário de sua gráfica foi avisado de um plano para agredi-lo. Uma caminhonete Silverado com suspeitos foi vista perto de sua residência horas antes do crime. A Polícia Federal apontou três suspeitos – Marcone Sarmento, mas a investigação local considerou as provas insuficientes, e o caso foi arquivado.
O assassinato de Manoel gerou comoção nacional e internacional. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) cobraram justiça, mas a impunidade prevaleceu. Em 2000, o deputado Aloizio Mercadante denunciou a falta de punição e pediu proteção para Geraldo Simões, ex-prefeito de Itabuna, que temia represálias. A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) levou o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que recomendou indenização à família, paga em 2010, e a reabertura das investigações. Apesar disso, os mandantes intelectuais do crime seguem sem identificação, e o caso permanece como um símbolo da violência contra a imprensa no Brasil.
Manoel Leal de Oliveira viveu como um farol em meio à escuridão da corrupção e da opressão. Seu jornalismo destemido, que investigava desde irregularidades políticas até abusos de poder, custou-lhe a vida. Mesmo após sua morte, seu legado perdura: Marcel Leal, seu filho, assumiu o comando do A Região e da rádio Morena FM, mantendo viva a chama do jornalismo local. A luta contra a impunidade, porém, continua, com julgamento de um suspeito, absolvido em 2005 mas julgado novamente em 2019, refletindo a lentidão da justiça.
A trajetória de Manoel é um testemunho da coragem de enfrentar o poder com a palavra. Seu assassinato, ainda envolto em sombras, é um lembrete do preço pago por aqueles que ousam iluminar a verdade. Em Itabuna, onde o cacau já não reina como antes, o eco de suas reportagens permanece, inspirando novas gerações a resistirem e a persistirem, como ele fez, até o último instante.